segunda-feira, setembro 12, 2005

RECORDAÇÕES DA CASA AMARELA/3

Li hoje duas crónicas de Leston Bandeira que bem gostaria de assinar, mas semprer que tentei descrever aquela realidade, sentia-me com falta de peso para expressar posição na matéria. Quando referi,ao de leve, o Instituto do Café, sem pôr a tónica no peso que impunha em Londres e na influência que exercia sobre países vizinhos ao «nosso», senti receio que me atribuissem algum compadrio com o regime. Recordo-me de uma vez, quando um secretário de Estado do Comércio, visitou Luanda, o governador Rebocho Vaz, um dos que ainda não tinha percebido que a «colónia» o ultrapassava e fugia da mão, ter pedido aos directores dos meios de comunicação para mandarem alguém ao Palácio, para um curto encontro com o senhor Secretário. E fez algumas recomendações, as quais deviam ser expressas aos jornalistas, para não chatearem o membro do governo de Lisboa. Como sou sábio perguntei a alguém do Instituto que diabo havia eu de perguntar ao enviado do Lisboa?
Café era assunto tabu. Digamos que funcionava como que um acordo de cavalheiros: o governo não se intrometia com a estratégia do Instituto e este não beliscava na política do governo. Portanto, imaginem, quando no intervalo de um golo de um qualquer golo de alcool, do mais caro, eu intervim, com um pequeno introito: «Mal pareceria, senhor secreário deEstado, estarmos em Angola e não se falar de café»... Um silêncio gelado e eu sentindo as orelhas a arder prossegui: «Não será exagero da nossa parte, sendo Portugal (?) , nesta altura o maior produtor mundial de café, os portugueses serem os únicos cidadãos dos países consumidores de café a não beber café puro, continuarmos a beber essa mistura arcaica?»
O homem de Lisboa sorriu e respondeu de forma bem humorada: «vocês têm razão!». Lembrou o que toda a gente sabia: que inicialmente a mistura teve por base salvar a cultura da chicória (a que se juntava, sem ser referido, grão feijão e outras anormalidades) o que forçava o café de Lisboa a ser quase tão mau como o espanhol! E ele, membro do governo, revelava que este caso estava em vésperas de ser reapreciado. De facto duas semanas depois a legislação foi modificada e o café passaou a ser café, só café...e que café (publicidade de uma marca de nescafé)!
Nesse dia, o homem do Instituto clarificou: «tinha que ser um estranho a levantar a questão. Na imprensa não se podia abordar o assunto, que a censura cortava e o Instituto e o governo não dialogavam. Em todo o caso do outro lado estava Marcelo Caetano, mais maleável do que o homem das botas...

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