quarta-feira, agosto 29, 2007

Mário Pinto de Andrade


Organizando fotografias, lendo o que foi sendo escrito no jornal "Africa", deparo, invetivalmente, com recordações, algumas das quais me fazem sentir saudades de algumas pessoas. É o caso do Mário Pinto de Andrade, falecido já há mais de 17 anos.
Conheci este "intelectual africano", como gostava de ser designado - detestava que o classificassem como político - na Guiné Bissau. Era ele ministro da cultura do governo de Luís Cabral. E a verdade é que o sector da cultura estava bem entregue, sempre muito movimentado, com iniciativas que davam a Bissau uma existência no campo da cultura que muito poucas outras capitais africanas teriam naquela altura. Foi na Guiné Bissau, durante este mandato de Pinto de Andrade que tive a oportunidade de assitir a alguns filmes que nem sequer passaram por Lisboa.
Mais tarde, depois do golpe de Novembro de 80, que o levou a desligar-se de Bissau e a procurar Cabo Verde, passámos algumas horas a conversar, sobre a actualidade africana e, muito particularmente, Angola.
Perguntava-lhe eu: "...então, Mário, quando é que temos a História que está por fazer do movimento de libertação...?
Respondia-me ele, com aquele sorriso matreiro e a voz um pouco nasalada: "...sabes como é que começou a Revolta Activa...? Sabes?... foi quando um miúdo, como tu, veio com essa mesma conversa: "... então, mais velho, quando é que nós sabemos a verdade histórica...quando é que esses documentos nos dizem o que esteve e o que está mal...? O resultado foi o que se viu.
A posição dele não era a de um espectador, relativamente a Angola, embora a sua preocupação fosse muito mais ampla, à escala de toda a África.
Escrevia de vez em quando para o África, cuja redacção o entrevistou por diversas vezes. Lembro, por exemplo, uma entrevista que me deu no Mindelo, a propósito das comemorações dos 50 anos da Revista Claridade e em que ele falava da esperança de que o caminho seguido pelas autoridades da Praia fosse seguido, em primeiro lugar, por todos os outros quatro de Língua Portuguesa e, logo de seguida, pelos países da África Ocidental.
De resto, alguns dias depois da conversa, tida no quintal do Hotel 5 de Julho para que ele não desperdissasse uma oportunidade de apanhar Sol, ele seguiria para Dakar, onde, com Maria do Céu Carmo Reis ( outra angolana que não vivia na sua terra), Samir Amin, Houtounndji Benin e outros, iria participar no "Forum do Terceiro Mundo" e onde seria debatida "a dimensão cultural do Desenvolvimento em África".
A sua opinião era estudada com respeito e funcionava, muitas vezes, como conselheiro especial, por exemplo, do Presidente Aristides Pereira.
Se havia alguém que conhecia profundamente as várias peripécias do movimento global de libertação dos Cinco era o Mário Pinto de Andrade, que, de vez em quando, gostava de contar algumas estórias.
Por exemplo,nos primeiros tempos da organização do MPLA, que contava com o apoio activo da Argélia, ele saía, muitas vezes do gabinete de Ben Bella, o então presidente daquele país do Magrebe, com um monte de notas de dólar embrulhadas em jornal.
Foi pena que tivesse insistido na ideia de que a sua visão das coisas, desde o começo, a ser divulgada, não ajudaria muito a solucionar os problemas ,que eram muitos.
A sua última posição política relativamente a Angola era a de que, no interior das forças políticas e da sociedade civil angolanas se encontraria gente para procurar e concretizar um consenso para uma solução. Ao lembrar hoje o Mário Pinto de Andrade, o amigo e o africano de grande valor, não posso deixar de lamentar que o tempo não o tivesse deixado escrever tudo quanto sabia.

domingo, agosto 26, 2007

As Fotos do Eduardo Baião


Há uns dias publiquei aqui duas fotografias de uma mesma mulher mucubal. De uma linda mulher, diga-se.Serviram de ilustração a algumas observações sobre coisas feias que estão a acontecer lá para o Sul.


As fotografias, todavia, foram muito comentadas, não directamente no texto, mas por gente amiga que telefonou. Houve mesmo quem afirmasse lembrar-se da reportagem da Revista "Notícia" em que elas apareceram.


É verdade, as fotografias foram publicadas no "Notícia" e são da autoria de Eduardo Baião, infelizmente já falecido, mas que ocupou um lugar muito destacado como repórter fotográfico.


Por sorte, já que possuo outras fotografias dessa reportagem, que o António Gonçalves, enquanto Chefe de Redacção do África, fez o favor de ceder, publico hoje uma imagem que revela o Baião em plena acção, ajeitando o seu "modelo" para a tal reportagem. Esta é uma foto do António Gonçalves.

sexta-feira, agosto 24, 2007

MAIS DO MESMO

Hoje foi um Vasco pouco polido a maltratar Robert Mugabe, tratado de assassino. Até se lhe pode, e deve, chamar pior, que a questão não é, nem foi, essa, mas a lusitana falta de jeito para o negócio. Deixar de fora da cimeirice um racista tirano, assassino e desonesto, especialmente detestado pelos ingleses, podia pressupor que os outros convidados fossem criaturas comuns. Que não eram já se sabia e se dúvidas houvesse logo foram desfeitas: «Com ele ou nada». E não podia deixar de ser! Além de racistas desumanos e desonestos não são parvos, sabem que se um deles for apeado os outros vão começar a tropeçar. Mas se o problema dos ocidentais, piedosos e tementes a Deus, é cuidar da saúde e do estômago aos africanos famintos, façam favor, ide, depressa e em força, como diria um ilustre cultor de africanidade. Desde que paguem portagem, bem entendido!

sábado, agosto 18, 2007

MODOS E MODAS





A modos que andamos confusos, a julgar pelo DN, que confronta ministro e secretário de Estado,
a propósito da vinda ou ausência de Mugabe, chefe de estado de um país africano, que foi colónia
inglesa. O matutino classifica Mugabe como um dos mais ferozes ditadores africanos. Não conheço ditador que se destacasse por ter bom coração, por ser crente da democracia ou por ajudar os velhinhos a atravessar o Rossio, a 5ªAv. ou o Arco do Triunfo! O ditador, coitado, é apenas, e só, ditador, nada mais que isso! Alguns romanos, dos primeiros a ficar para a História, ficaram na memória por serem amigos dos animais: nunca esqueciam de alimentar os pobres leões cativos. Nem por isso deixaram de morrer incompreendidos.
Melhor sorte teve o marquês de Pombal, ditador do reino, que, entre outras maldades, mandou liquidar duas famílias inteiras, até à terceira geração, e tem uma estátua reluzente, em Lisboa, ao lado de um leão. Ou Franco, que recuperou a monarquia da república débil e aleitou o Rei, que lhe sucedeu. Enquanto vivo chacinou uns quantos etarras, nacionalistas incompreendidos, um tudo nada insaciáveis. É verdade que o de Santa Comba foi o que foi, mas em boa e honesta verdade o Zé dos Bigodes ficou a dever-lhe uma data de anos de boa imagem de anti fascita, que não era nem nunca foi, como de resto a História não tardou a revelar!
Não foi um ditador sanguinário que subscreveu o despejo de duas bombas atómicas sobre gente viva, que logo deixou de viver.
Mas a questão existe. Há ditadores. Alguns são presidentes, de países, de bancos, de juntas, de câmaras. É quase absurdo considerar ditador demoníaco, e agravado por não gostar de ingleses, o presidente do Zimbabwe, sem classificar os restantes ditadores de outros países africanos, com os quais, aliás, os países ditos democráticos negoceiam e não raro por ínvios caminhos.
Ontem li que o sujeito que molestou uma criança foi preso. Já tinha sido preso e condenado a 16 anos pelo mesmo motivo. Cumpriu parte da pena e saiu. Voltou a ser preso e condenado, pelo mesma violência e voltaria a sair. Se o jornal não exagerou, ainda voltou a ser preso por molestar outra criança. Dá a ideia de que não é proíbido molestar crianças, desde que haja paciência para ir pagando as facturas. Não sei se não seria melhor ir viver no Zimbabwe...

quarta-feira, agosto 15, 2007

Os Casamentos "Tradicionais" e a Desagregação Familiar


Estas duas fotografias, feitas com grande meestria representam a mesma mulher junto da sua gente. São Mucubais, que vivem entre o deserto de Moçamedes e as faldas da Serra da Chela, à procura dos melhores pastos para o seu gado. Vivem, essencialmente do que lhes dão os rebanhos: carne e leite. Por volta de 1975 eram cerca de 35.000 individuos e tiveram um papel fundamental na guerra contra a África do Sul, já que impediram a ligação entre o Lubango e Namibe com a segurança que os sul-africanos desejariam.
O seu terrritório, muito amplo, vai do Namibe ao Chiange e tem como vizinhos os Nhanheca Humbe (muílas e mogambos).
Entre estes dois grupos estão a acontecer pequenas desgraças que podem transformar-se numa catástrofe. É que os "senhores do poder", reclamando práticas da tradição vão às aldeias de criadores de gado e de agricultores escolher as filhas casadoiras (que, no caso, se considera logo após a primeira menstruação - o mufiku).
Nos primeiros tempos não pagavam, sequer o que a tradição manda, o chamado "alambamento", normalmente constituído por bois e por peças de utilidade doméstica, como mantas e outras coisas.
Os pais protestaram e agora os bois lá aparecem. Assim como os filhos produtos destas relações tradicionais, mas que, na prática, não têm pai, nem família. A sociedade camponesa do Sul de Angola, ao que se supõe com a excepção dos mucubais, está a ficar desagregada, por culpa dos senhores que praticam "o casamento tradicional", indo de jeep buscar e devolver as noivas. Não há ninguém que olhe por isto, ou Angola virou terra de cafagestes puros, sem respeito por nada nem por ninguém, nem por si próprios . E ainda falavam dos colonos com duas famílias... Pelo menos eles assumiam os filhos!!!