terça-feira, dezembro 30, 2008

Angola e o Futuro



Para quem, como eu, está longe estando perto, os acontecimentos em África tocam campaínhas de alarme por todo o lado. A situação da Guiné - um país que teve apenas dois chefes de estado em cinquenta anos de independência - sendo alarmente, não faz esquecer o Zimbabwé, antigo celeiro de África, transformado agora em campo de morte, doença, ostentação, miséria, corrupção e todos os males a elas associadas. O Povo do Zimbabwé está a ser vítima da ganância dos seus próprios libertadores. Na Guiné, o Povo paga a imaturidade política que os seus dirigentes de cinquenta anos alimentaram.

Se olharmos para a República da África do Sul - apesar da ausência de informação - não é difícil concluir que à dominação económica, com responsabilidade política - sucedeu um regime irresponsável do ponto de vista político e capaz de construir um sistema económico ultraliberal, com a dicotomia entre ostentação e pobreza extrema, a ele inerente.






Com a inevitável próxima substituição de liderança na chefia do Estado, tudo se complicará, pelo que não é, de todo, impossível, imaginar que a República da África do Sul, antiga super-potência regional, acabe por nivelar por baixo, atingindo os níveis de desenvolvimento dos países vizinhos, com tendência para ficar abaixo de alguns deles.


Ora, um deles é Angola, cujo passado se procura esquecer - a meu ver, mal, porque contém muitas lições positivas, mesmo, quando, aparentemente, negativas - para se anunciar um futuro rutilante, para uma cidade - a capital - tipo Barhaine (a doença dos multimilionários angolanos) e o resto do país dependente do que se decidir, agora no Palácio do Governo, ou no Futungo, em tempos de pausa...

Ao lermos o que se escreve sobre a política angolana rapidamente percebemos a sua dependência do que pensa, do que faz ou do que deseja fazer José Eduardo dos Santos. Tal como em toda a África, tudo está dependente de um homem apenas. Toda a gente em Angola gostaria de estar na cabeça de JES.

Também se percebe que ele está confuso. À media que os anos avançam e as maleitas se evidenciam ele percebe a responsabilidade que lhe pesa nos ombros. Como manter unido um país que foi dividido por diversas guerras e por vários líderes? Como garantir que a sua própria família - numerosa - sobreviva ao seu passamento? Como evitar que a tendência de crescimento e de imposição como Estado líder na África Central e Austral se inverta?




Há uma certeza a que os angolanos não podem fugir: o futuro da sua terra está definitivamente ligado ao do seu actual presidente e, por isso, fazem pouca fé as publicações de sondagens e opiniões em que Zé Du, numa eleição presidencial directa, perderia o que quer que seja. Ninguém joga o futuro por uma janela a troco de um capricho. Os angolanos já sofreram muito...

Ora, se assim é, qual é problema ? (vamos fazer mais como se esse é o problema que estamos com ele - Mankiko dixit)

O problema é, como em toda a África, a sucessão. Ela não está minimamente assegurada em Angola. No caso de JES, de um momento para o outro ficar incapacitado ou, simplesmente, morrer, assistiremos a outra guerra, ou a outras guerras.

Há apenas uma pessoa capaz de evitar isso - o próprio José Eduardo dos Santos, construindo um processo de sucessão inteligente, baseado na competência e não na fidelidade pessoal, construído na pluralidade etnico-cultural e não no monolitismo político, assegurando que um grupo de líderes sejam capazes, depois dele, de se unirem em torno da unidade do Estado Angolano, garantindo a sua diversidade nacional.



Se ele conseguir reunir esse grupo de gente - homens e mulheres - também conseguirá cumprir uma das suas actuais evidentes preocupações: que a sua família, cujo estatuto advém, obviamente, da sua condição de parentes do Presidente da República de Angola ( por muito mérito que se encontre aqui e ali) seja respeitada num futuro de uma Angola pacífica, capaz de olhar para as partes sem esquecer o todo.


Oxalá José Eduardo dos Santos pense no futuro de todo o País e deixe de se preocupar exclusivamente com o futuro dos "seus".



sexta-feira, dezembro 05, 2008

E os Zimbabweanos, Senhor?


As notícias que chegam há anos do Zimbabwé arrepiam qualquer pessoa. Um ditador psicopata destruiu um dos países mais prósperos da África Austral, rodeando-se de um bando de crápulas racistas, cuja única missão ao longos dos anos, depois da Independência, foi explorar em seu proveito as riquezas que outros tinham produzido e continuam a criar.

Comandados por um monstro de nome Mugabe atiraram o seu próprio povo, em nome do qual dizem ter lutado contra Yan Smith, para a mais absoluta miséria.

É verdade que hoje Mugabe já é apenas o porta-voz de um grupo que tomou conta do país e continuará, até ao último cêntimo, a roubar o povo mártir do Zimbabwé.

Agora é a cólera que mata todos os dias, que ameaça todo o país. Mugabe pede auxílio e diz que precisa não sei quantos milhões de Euros para fazer face à calamidade pública. Mas quem é que vai confiar dinheiro a este grupo de corruptos?

As notícias vindas de Harare magoam, mas as cumplicidades que se descobrem no suporte a esta situação ferem como golpes de espadas afiadas pela ganância, pela defesa de interesses muitas vezes inconfessáveis, porque pessoais, porque definidores de alianças espúrias.

Por que razão Angola continua a apoiar Mugabe? Terá que ter autorização da China para se juntar aos chefes de Estado da região, e não só, que reclamam que o ditador deve deixar o poder a bem ou a mal?

Onde estão os movimentos cívicos angolanos, agora que parece haver democracia, para reclamarem do seu governo uma posição humanista em relação aos pobres zimbabweanos vítimas de uma ditadura execrável que já ultrapassou tudo?

segunda-feira, novembro 17, 2008

A Síntese de Mia Couto

O Jornal moçambicano "Savana" publicou um texto de Mia Couto com o título "SE BARAKA OBAMA FOSSE AFRICANO". Este texto já chegou ao meu e-mail dezenas de vezes. Este facto é uma demonstração inequívoca do papel que Mia Couto tem como escritor e jornalista. Ele sempre consegue fazer a síntese justa daquilo que os africanos (sem cor) pensam. Daqui envio um forte abraço ao Mia Couto, os meus parabéns, ao mesmo tempo que aproveito para pedir aos dirigentes africanos com cor que eliminem das suas constituições os impedimentos racistas que elas contêm. Assim ficaríamos a saber que esta eleição não é considerada de um ponto de vista racista: "o preto ganhou ao branco", tal como gritava um popular do Quénia no dia da eleição de Obama, correndo ao lado de uma câmara de televisão.

sexta-feira, novembro 14, 2008

Angola - A Fraude das Empresas Públicas


Não resisto a transcrever aqui um texto publicado no NOVO JORNAL de hoje, assinado pelo seu Director-Adjunto, GUSTAVO COSTA, e subordinado ao título "O PRIMEIRO MINISTRO E A FRAUDE EMPRESARIAL PÚBLICA. Por muitas razões: pela verdade retratada, pela acutilância do texto e também porque, de repente, me lembrei que um dia (já lá vão muitos anos), descobri num Conselho de gestão de uma empresa, cujo principal responsável era eu, um analfabeto que me havia sido imposto pela estrutura partidária...

Quando, aqui há umas semanas, questionei a «obesidade governamental», inquietavam-me também algumas «traquinices» daqueles que se auto-intitulando de gestores» de empresas públicas estão a tirar o sono tanto a economistas sérios, como a contribuintes igualmente sérios.
Depois de ter anunciado o saneamento das empresas públicas, o que o Primeiro-Ministro, Paulo Kassoma, terá agora de enfrentar, não são apenas essas «traquinices», mas a difícil caminhada que será necessário empreender para as sanear, de alto a baixo, devolver-lhes saúde financeira, insuflar-lhes capacidade de gestão, prepará-las para a concorrência, num mercado cada vez mais «feroz», e restituir-lhes dignidade moral e empresarial.
O Primeiro-Ministro terá também que promover a descentralização empresarial para criar pólos de desenvolvimento fora de Luanda e da restante orla marítima. Trata-se de uma «cesariana» que pode vir a traumatizar os progenitores de «crianças», que tendo sido momentaneamente «dopadas», encarnaram a força de «elefantes brancos» que, afinal, têm pés de barro e cabeça de tolos. E, de quem é, em parte, a esponsabilidade por essedesvario?
Desde logo, do Estado por se ter imposto no passado, de forma paternalista e demagógica,como o principal «guarda-chuva» de admissões e promoções populistas. Logo, esse mesmo Estado vai ter de assumir agora o despedimento de mão-de-obra excedentária e, na maior parte dos casos, desqualificada, que custa aos seus cofres todos os meses milhões de dólares.
Esse é um desafio inadiável e esperemos que não adormeça à cesta na retórica. Mais do que recomendável, é imperativo que a «purga» se estenda, sem excepção, a todas as empresas públicas e não apenas à TAAG. Essa é, de resto, uma condição essencial para dar o pontapé de saída à moralização de um dos pilares da nossa economia: as empresas.
Mas, sanear o pessoal excedentário dalguns desses «monstros» não é o único desafio que se coloca aos novos governantes, que agora as têm sob a sua tutela. Mais do que isso, será necessário introduzir uma nova e moderna cultura de gestão empresarial. Porquê? Porque há gente, há mais de vinte anos, à frente de empresas que não sabe sequer lavrar um ofício.
Há «gestores-economistas» que argumentam que a «raíz quadrada» nem sempre dá certo! Há ainda empresas que têm, proporcionalmente,tantos trabalhadores quantos «chefes». Há gente, nestas circunstâncias, que não prestando contas ao Estado, também não sabe como fazê-lo, porque nem sequer sabe calcular a taxa de juros de empréstimos contraídos pelas empresas que é suposto gerirem. Custa acreditar, mas a verdade é que «gestores» deste descalabro, sentem-se confortavelmente acomodados…Essa «fraude» nem sequer precisa de ser descodificada.
Os poros dos seus autores, desprovidos, na maior parte dos casos, da mais elementar noção de gestão, destilam má relação com o dinheiro, «ódio» pelas normas administrativas, esbanjamento de recursos e uma crónica incapacidade governativa. As empresas adormeceram à espera de decisões políticas, que nunca chegaram ao destino.
Vítimas de abusos de poder, a única coisa certa nelas é que, afinal, tudo ou quase tudo,estava errado! Resultado: mal educadas e, pior, habituadas ao proteccionismo do Estado, a deriva na maior parte delas é total!
Quem a provocou, como «gestor» público, não pode agora ser desculpado, mesmo porque, depois de ter endossado «cheques em branco» aos contribuintes, as desculpas não se pedem, antes evitam-se!
Agora, só há um caminho a seguir: que Deus nos livre rapidamente desses pseudo-gestores!
Eles que sejam substituídos por gente competente, gente que saiba perseguir a competitividade, a dignificação profissional e o lucro como o «soro» que há-de alimentar as veias da economia de Angola, fora da orlado petróleo e dos diamantes.
O Estado tem de os substituir porque nessas empresas tiveram a «gentileza» de fazer da capitulação profissional e do vazio ético, dois dos símbolos da decadência do seu «modelo» de gestão.
O que estas engravatadas criaturas demonstram saber fazer bem é ostentar fatos Armani,BMW X6, relógios «Rolex», cabelo cheio degel e forjar «viagens em serviço» ao exterior do país com fins turísticos…
Alguns deles, de mediocridade pavorosa, como diria Baptista Bastos, um dos maiores cronistas portugueses, não dão conta sequer de que, mais do que sofríveis, são doentiamente insignificantes! Não estão preocupados com a gestão empresarial mas apenas obcecados com o poder empresarial. Pensam que só sabem mandar. Acontece que, desgraçadamente,não sabem fazer nem uma coisa, nem outra!Não sabem mandar e, pior do que isso, muito menos pensar. E o que o país mais precisa, neste momento, é de gente que saiba pensar e gerir. Gente que saiba formular uma nova ideia de administração empresarial pública, com o concurso de jovens tecnocratas, ávidos por libertar novas competências e modernas técnicas de gestão ou mesmo com recurso a gestores expatriados.
Gente que saiba levar as empresas públicas a ganhar músculo e a perder gordura. Porque o que a experiência comprova hoje, é que, na maior parte delas – e a crítica aqui não deve ser confundida como uma defesa da sua privatização - já só resta a poeira de um império esquelético.
Agora há que projectar «fénix» para sanear primeiro e depois delinear uma nova filosofia de gestão para o sector empresarial público em Angola. Mas, sanear para quê?
Sanear para levantar o tapete, destapar a porcaria nele incrustada e sepultar «mitos».
Sanear para quê? Sanear para pôr ordem na maioria das empresas públicas, que estão
transformadas em autênticas agências «funerárias» de emprego.
Sanear para quê? Sanear para enterrar «cadáveres» que exalam um cheiro pestilento sobre um modelo de gestão miserável.
Sanear para quê? Sanear para «sepultar»também clientelas que se alimentam do tráfico
de influência e da corrupção.
Sanear para quê? Sanear para não sermos contaminados pelo vírus de pseudo-gestores que só sabem exibir incompetência, promover o nepotismo e, pasme-se!, auto-elogiar, em praça pública, a sua irresponsabilidade empresarial, expondo, sem quaisquer pudores, em museus de maus costumes, a arte do…desperdício, do roubo e da imoralidade…presarial pública…

segunda-feira, novembro 10, 2008

As Omissões - Resposta

Um Leitor deste blogue, Rui Moio, faz-me algumas perguntas a respeito do meu último texto. Tenho todo o gosto em o informar de que o NOVO JORNAL é um Semanário que se publica em Luanda. Vai no seu nº 43. Ainda não está na Internet, mas jugo saber que a sua direcção está a fazer todos os possíveis para que tal possa acontecer brevemento. O apelido do Amável é Fernandes e, ao tempo da invasão de Angola pelas tropas sul-africanas, era comissário político das FAPLAS. Há um depoimento seu no dossier que refiro no texto anterior, em que relata alguns factos da altura e refere algumas pessoas, sem, todavia, ter tido o cuidado de enquadrar devidamente as circunstâncias dos factos e o comportamento dos citados e de não referir outros nomes, cujas responsabilidades a História não pode esquecer.

sábado, novembro 08, 2008

As Omissões da História

O Novo Jornal publicou ontem um dossier bastante interessante sobre os 33 anos de independência de Angola, com alguma relevância para os primeiros tempos e para as guerras que se foram sucedendo.
Tenho apreciado o esforço desta publicação no seu alinhamento com um jornalismo que podemos classificar de referência.
Não se podia exigir certamente que o Jornal referisse todos os acontecimentos importantes destes últimos 33 anos. Todavia, o Amável poderia ter lembrado alguns pormenores das fugas da Huíla, de Benguela e de outros locais, o comportamento de alguns dos dirigentes de então, responáveis pela morte de muitos milhares de jovens.
Não foi apenas em Katengue - e mesmo esse massacre ficou a dever-se à ignorância das direcções político-militares, tanto da Huíla, como de Benguela.
Só há um herói desses dias, o Comandante Kassange e o Amável sabe disso.

sábado, outubro 25, 2008

Há Outras Angolas

Os meus dois textos anteriores versavam as eleições angolanas e os respectivos resultados - alguma esperança também ( porque não dizê-lo, embora os "angolanos puros" me neguem esse direito ?).
Tenho acompanhado com muito mais interesse a evolução política angolna dos últimos tempos, convencido de que havia mudanças a acontecer.
Devo confessar que estou desiludido. A começar pelas regalias que continuam a ser concedidas aos parlamentares eleitos...
Mas, isso é a questão menor. A mais importante tem a ver com a constituição do novo governo. E não falo da qualidade, refiro a quantidade - o que, à partida, significa uma concentração enorme d em Luanda de um poder, que,na maioria das circunstâncias é perniciosos, porque apenas vai significar a existência de um maior número de pessoas a querer enriquecer e a favorecer os amigos e os conhecidos ...
Continua-se a pensar Angola como um país pequeno, igual a tantos outros e nunca mais se esquece a matriz colonial - uma das razões por que o racismo continua cada vez mais evidente e, em alguns casos, mais violento.
Trinta e cinco ministros e sessenta vice-ministros representam uma máquina ingovernável, incapaz de pensar o país. Todos eles vão apenas olhar para si próprios e para os mais próximos.
Seria inteligante perceber que o país é enorme e diverso, que não há apenas um povo, mas vários, e que é necessário, com todos esse povos, construir um Estado unitário.
Pensando desta maneira, o esforço que se está, erradamente, a desenvolver num governo altamente concentrado, faria mais sentido se fosse canalizado para um programa de descentralização, tendente uma verdadeira regionalização, capaz de governar cada região, de acordo com as suas caracteristicas próprias, com as suas idiossincrasias culturais e outras, dentro de um programa comum de unificação de um Estado.
Este seria o princípio para a constituição de um Estado Federal, tal como os Estados Unidos e de modo a evitar futuras tentações de separações autonómicas - que vão acontecer mais dia menos dia.
Esta oportunidade que o MPLA tem, depois de uma vitória eleitoral esmagadora e sem contestação significativa, não pode ser desperdiçada no esmagamento de pequenos adversários ou na construção de um poder faraónico. O MPLA tem - agora - a obrigação de perceber o país que governa -um país que tem um milhão de formas de organizar - e esquecer, de uma vez por todas, o medo de ser neocolonizado. É que essa neo-colonização já conteceu: foi efectuada pelos dirigentes do MPLA que têm estado no poder desde há trinta anos.
Este governo, com trinta e cinco ministros e sessenta vice-ministros, daqui a quatro anos é uma presa fácil de um grupo político que tenha alguma capacidade de organização e perceber que não tem que cumprir a agenda política do MPLA. Não estou a falar da UNITA, que, do ponto de vista político nunca foi nem é nada.

domingo, setembro 21, 2008

O Respeito Por Uma Vitória


Há um poema do Manuel Rui - as crianças do Huambo - que me faz sempre lembrar a minha infância. E ouço-o muitas vezes.


Recordo-me a mim e ao M. Rui ( o Cantinflas), no tempo em que éramos duas crianças felizes porque, entre outras coisas, quando olhávamos para o céu, nas noites estreladas do Huambo, éramos capazes de vislumbrar, para além das constelações e o Cruzeiro do Sul , barcos perdidos, anjos que nos acenavam. Também contávamos as estrelas que caíam e acompanhávamos os seus movimentos rápidos.


Depois criávamos as nossas próprias estórias sobre os locais onde elas iriam cair. Éramos felizes, nós e os outros da nossa idade; não havia violência nas ruas, toda a gente que por nós passava era nossa amiga. Todos nos conheciam. E,quando íamos para o Colégio falávamos dos nossos sonhos, do futuro, do que queríamos que fosse a nossa vida, trocávamos confidências sobre aquilo que imaginávamos ser já o amor...


Esta balada, que o Paulo de Carvalho canta como ninguém no CD do meu carro e que se chama os meninos do Huambo, leva-me sempre áqueles tempos em que os senhores todo poderosos viviam longe , em Lisboa, e nós éramos felizes e não posso deixar de ficar a pensar na frustação do Cantinflas ao ouvir o Paulo de Carvalho, cuja voz, inevitavelmente, lhe lembra os sonhos de há trinta anos.


OH! Rui! é que foram exactamente as crianças que mais infelizes ficaram quando os todo-poderosos dessa nossa terra ficaram perto delas.


Repara: estragaram-lhes as escolas, destruiram-lhes as casas, mataram-lhes o pai e a mãe, atiraram-nos para os caixotes do lixo à procura de alguma coisa para comer, roubaram-lhes o brilho dos olhos, fizeram das crianças da nossa terra adultos à força e meteram-lhes armas na mão. Para muitas das crianças, que deviam estar à fogueira a ouvir as estórias, matar passou a ser uma rotina e as estrelas jamais seriam do Povo...


Eu sei que o poema é do começo em que tudo era esperança - depois, tem a utopia do poeta...


Eu sei...mas também sei que o sonho do poeta pode e deve ser respeitado e cumprido se os todo-poderosos de agora resolverem ter respeito pela vitória eleitoral que o Povo lhes conferiu, na esperança de que as suas crianças possam voltar a ser felizes.


Se essa gente que passou grande parte deste tempo, que para ti e para mim foi de sonho e angústia, a conspirar para entrar no mundos dos ricos, resolver respeitar a vitória que lhes manteve o poder, talvez um dia destes possamos, com as nossas cabeças brancas ir ouvir os meninos do Huambo cantar a sua própria canção, debaixo de um céu estrelado, sem ameaças.


Tu, Rui, que estás aí, lembra-lhes a obrigação do respeito - também por ti, pela tua utopia e por nós todos que fomos crianças felizes na Kalumanda.

terça-feira, setembro 09, 2008

MPLA - Uma Vitória Respeitável

Os números são eloquentes e as declarações dos observadores internacionais também: o MPLA ganhou as eleições legislativas com um score impressionante (mais de 8o por cento dos votos expressos) e, ao contrário daquilo que muitos previam ,não há notícia de qualquer irregularidade, embora tivessse havido algumas falhas de organização, perfeitamente normais num país que há 16 anos não organizava um evento desta natureza.
Embora haja em Angola, particularmente em Luanda gente que não goste que os estrangeiros, quer dizer, os brancos, se debrucem sobre a sua realidade já que, no dizer de um jovem intelectual bem posto que eu vi um dia destes na TPA Internacional, os portugueses "estão com dor de cotovelo porque a guerra acabou...etc, etc" e mais uns disparates do género, mostrando o seu saber contido em livros de Kissinger e não sei mais de quem e, ao mesmo tempo, afirmando que viveu e estudou em Portugal...embora ainda permaneçam essas cabeças, apesar dos professores...sempre arrisco uma análise política aos resultados eleitorais angolanos.
Estes mais de 80 por cento obtidos pelo MPLA, em eleições livres, significam, antes demais, a possibilidade de se concretizar uma unidade nacional muito ameaçada com as perspectivas tribais da UNITA e da FNLA. Esperemos que estes 80 por cento permitam corrigir as atitudes claramente racistas de uma certa elite do MPLA.
O resultado atingido permitirá igualmente ao MPLA pensar na democracia económica e social, já que a democracia política lhe concedeu uma legitimidade impressionante.
Quando falo em democaria económica significo que é tempo de acabar com os benefícios escandalosos atribuídos a círculos políticos e militares que abusaram ao longo dos últimos anos do poder que a proximidade das altas esferas lhes atribuiu.
Também quero significar que é necessária uma abertura clara ao investimento estrangeiro sem que as decisões tenham que passsar por um "general" já reformado mas ainda sequioso de dinheiro e que, em alguns casos, nem sequer sabe administrar, acabando por cair nas mãos dos que estão a "correr" para Angola à espera de um bom negócio de um general analfabeto e de bolsos cheios.
Quando falo em democracia social estou a lembrar a necessidade de acorrer urgentemente às zonas mais longincuas, mais afastadas dos grandes centros urbanos e salvar o que ainda há para salvar das famílias de agricultores, de criadores de gado, promovendo um desenvolvimento que se reja por uma modernidade adaptada à tradição angolana.
Não é possível que o MPLA possa deixar que continuem a ser desenvolvidas práticas atentatórias da estabilidade social dos povos do Sul, onde aparecem os "grandes senhores" de Luanda a pagar os "casamentos" com as jovens a quem visitam de vez em quando, sem ligarem aos filhos que entretanto vão nascendo.
Esta vitória, aparentemente exagerada, tem que conduzir Angola ao clube dos países cujas leis têm em conta os direitos fundamentais de todos os individuos, ao aparecimento de uma informação capaz de estar de todos os lados, defendendo, sobretudo, os interesses do povo anónimo.
Esta vitória do MPLA tem que significar o início de uma nova era para Angola e para o seu povo, ou antes, para os seus povos. Que todos eles consigam rever-se nas instituições de um Estado que a todos representa mas que a todos respeita. Um só Povo, uma só Nação é um slogan perigoso que sugere um centralismo autoritário. Um Estado para várias nações é mais conforme à realidade angolana - o futuro o dirá.
Por último: era bom que esta vitória do MPLA tivesse efeitos positivos na comunidade internacional e que Angola começasse a ser olhada com outros olhos, sobretudo pelo esforço que vai fazer para mudar o que, evidentemente, está mal.
Já agora: que os mais de 80 por cento do MPLA tranquilizem os funcionários dos consulados angolanos no estrangeiros e comecem a sentir-se como fazendo parte de uma comunidade com mais de duas centenas de estados, cujos cidadãos viajam cada vez mais, sem que essas viagens tenham sempre que ser consideradas perigosas...

sexta-feira, setembro 05, 2008

Um dos Tabus da Nossa História

Uma questão prévia: há anos que não compro o jornal Expresso. Razões? São várias, mas a principal é perceber neste semanário um jornal de aldeia em que meia dúzia de saloios obedecem, de olhos e ouvidos tapados, às ordens dos sucessivos donos do poder, isto é, do dinheiro.



Não ler o semanário que se transformou numa espécie de instituição e vive à sombra dessa condição e de outras coisas menos definíveis , não me faz diferença nenhuma (não deixo de ser menos informado por isso).


Um dia destes alguém insistiu comigo para eu ler na Revista daquele semanário um texto sobre os acontecimentos de Março de 1961 no Norte de Angola. E o amigo, que entende a minha posição, resolveu ir mais longe: passou cá por casa e deixou-me a revista de 30 de Agosto para eu ler o texto: "Sobreviventes e ignorados".



Fiquei surpreendido com o nome da autora, Valentina Marcelino, que se iniciou nas lides do jornalismo - já lá vão muitos anos - no Jornal África, de que eu era director. Era uma época em que se formavam jornalistas com a ideia de que de nós se esperava uma atitude de controlo e crítica. Éramos o "quarto poder" e nunca "aliados" dos outros poderes.



O texto revela uma história importante, alicerçada em factos reais, contada por um homem, um administrador de Concelho dos velhos tempos coloniais, Custódio Ramos, que, além de contar o que viu em dois relatórios, agora encontrados no espólio de um antigo homem do regime, teve ainda a oportunidade de esconjurar o seu apoio ao regime fascista, do qual acabou por ser vítima.



Vítima porque o teor dos seus relatórios não convinha à ideologia do momento já que evidenciavam uma facto "horroroso": o regime tinha abandonado miseravelmente os portugueses do "ultramar" depois de uma parte importante dos brancos que habitavam o Norte de Angola ter sido chacinada por terroristas absolutamente tresloucados.



E, como se não bastasse, mais tarde resolveu incluir num relatório de inspecção levada a cabo por si no Golungo Alto actos de corrupção, de cumplicidade em práticas de escravatura e abusos de poder da PSP. Também não convinha ao sr. ministro do ultramar, Silva Cunha.



Ao acabar de ler o texto da Valentina fiquei perplexo e mais se arreigou em mim a justieza da minha decisão de continuar a não comprar tal jornal.



É que a estória pedia mais. Não sei quem foi, mas aposto que não foi a sua autora, porque conheço os princípios em que foi formada, deitou fora a oportunidade de começar a esmiuçar a sério um dos grandes tabús da nossa História.

E porquê? Pela mesma razão que levou o regime fascista a castigar o administrador de posto, posteriormente promovido à condição de intendente e ainda de inspector, Custódio Ramos.

Ao Expresso e à comunicação social portuguesa de uma maneira geral não convém mexer neste passado. O que convém a todos é a ideia de que os portugueses "africanos"eram todos uns bandidos e uns exploradores de escravos e, por isso, as acções de terrorismo a que foram sujeitos não foram nada disso, constituiram o começo de uma guerra justa, embora iniciada contra uma população pacífica e desarmada.

Aos donos de hoje, que mandam nos saloios, convém manter essa versão dos acontecimentos para não correrem o risco de lhes cortarem o acesso aos negócios milionários e pouco claros da chamada "elite" angolana, a proceder à "acumulação primitiva" de capital.

Os "donos" de hoje conhecem a História de 1961; alguns deles provocaram o descontentamento em cima do qual se desenvolveu a ideia de massacrar os brancos - "o inimigo".

Os "donos" de hoje também já regressaram a Angola e estão a aproveitar da "acumulação primitiva" de meia dúzia de corruptos para reassumir, ainda que de forma mais discreta, mas mais rentável, a posição de outros tempos, dos tempos em que - eles sim - promoviam a escravatura na mais rica "provincia ultramarina"do império salazarento.

Estes dois relatórios podiam ser o ponto de partida para que os portugueses soubessem parte da verdadeira História dos portugueses de África e percebessem, de uma vez por todas, que os crimes do regime fascista não se ficaram pelas prisões arbitrárias, pelos assassínios políticos e pelo controlo absoluto da informação.

O regime colonial fascista português negou aos portugueses a possbilidade de viverem noutras paragens, em harmonia com toda a gente, promovendo o desenvolvimento e o bem estar para todos, no respeito dos direitos de todos.

Hoje ninguém quer saber disso. Já lá vão quase cincoenta anos e a verdadeira exploração só agora principiou.

É por isso que "Sobreviventes e Ignorados" é um texto seguramente incompleto e deixa aquele sabor " a pouco"...


segunda-feira, agosto 25, 2008

Chiwale, um Homem à Procura do Seu Lugar

Samuel Chiwale publicou há pouco tempo uma autobiografia com o título "Cruzei-me com a História".
O livro, editado pela Sextante Editora é a descrição de uma série de factos relacionados com a guerra de Angola, de que Chiwale foi um elemento muito activo, sempre ao lado de Savimbi, mesmo quando este o humilhou e lhe mandou queimar uma tia sob a acusação de feiticeira.
É uma pena que o livro não tenha um fio condutor e não se percebam muito bem os seus obejctivos. A narrativa dos seus primeiros anos de vida explica, de certo modo, o seu racismo, porque é reveladora da sua realidade pequena. Ele só conhecia o seu pequeno mundo onde os pequenos senhores se transformavam em grandes ditadores.
A sua vida dedicada à guerra, que ele, um pouco à maneira europeia, diz que foi feita para libertar a pátria (qual pátria?), foi, afinal, dedicada a expulsar os brancos. Foi, de resto, o objectivo de todos eles. E a política em Angola - em diria em toda a África - tem ainda como grande motivação esse ódio rácico.
No caso de Samuel Chiwale ele é muito evidente, sobretudo quando, tentando contrapor ao slogan do MPLA "Um só povo uma só Nação" ele diz que a UNITA considerava todas as etnias como tendo direito a governar o seu país. Mas... os brancos não faziam parte... para ele, os brancos eram o inimigo. Com duas excepções: os madeireiros com quem a UNITA negociou o transporte de abastecimentos e a venda dos seus produtos a troco da exploração das madeiras e em 1975, quando precisaram do dinheiro dos empresários portugueses para se instalarem no país.
As primeiras páginas do livro sugerem um texto de um candidato a candidato à Presidência da República, mas, depois, o texto fica tão confuso que se percebe como o grito de alguém à procura de um lugar a que se julga com direito (e certamente terá) mas a quem já ninguém reconhece autoridade.
Na descrição um pouco atabalhoada de combates e marchas, de intrigas e alianças, há uma outra grande preocupação: a defesa de Savimbi e da UNITA como movimento político, embora se perceba que Chiwale reconhece que a UNITA sempre foi um movimento militar. Daí que neste momento ninguém considere o ex- comandante geral das FALA como uma personalidade. Hoje é o tempo dos políticos. Os generais vitoriosos - os do MPLA - vão fazendo pela vida enquanto é tempo.
Ele também não se deve queixar, não deixará de ter um bom carro, uma boa casa e um bom dinheiro para gastar. O Presidente da República sabe tratar do "seu povo".


quinta-feira, agosto 21, 2008

Uma Estória de Maconginos

A 6 de Novembro de 2005 publiquei aqui uma "Estória de Maconginos". Quem a quiser ler basta ir ao arquivo do blogue.
Um dia destes, uma leitora fez o seguinte comentário a esse texto:" dei, por mero acaso -a investigar outra matéria com este artigo...lamentavelmente com muitos factos distorcidos e erros históricos.
Pena!
Anabela de Araújo.
Reconheço o estilo, adivinho as motivações e com um e outras avivo memórias: uma boas, outras más.
Pena! que o comentário não seja mais explícito e indique quais os factos distorcios e os erros históricos e se fique por esta afirmação definitiva de quem é senhora e dona da verdade.
Pena!

sexta-feira, julho 25, 2008

Parabéns

Exmo. Sr. Leston Bandeira,

Serve o presente para lhe dar os parabéns pelo blogue «Africandar».

Atentamente,

Associação Portuguesa de Cultura Afro-Brasileira
Herdade Sesmaria Velha R. Primavera n.º 28
Coutada Velha 2130 - 010 Benavente, Portugal
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Fernando Alves

domingo, junho 15, 2008

Uma Verdade que Dói

Não resisto à tentação de transcrever aqui um texto publicado no "The Times", no dia 26 de Maio de 2008 e assinado por uma mulher sul-africana: Nom Fundo Xulu
XENOFOBIA

Para onde iremos quando a África do Sul estiver destruída?

Houve uma altura na minha vida em que procurei desesperadamente uma empregada doméstica porque não conseguia dar resposta ao trabalho, ao bebé e às tarefas domésticas.
Dirigi-me ao quadro de anúncios de uma loja de conveniências da vizinhança e anotei alguns contactos. Telefonei a um certo número de mulheres e marquei encontros com seis.
Uma delas, sul-africana, não apareceu, mas mandou-me um kolmi. Quando lhe liguei, perguntou-me se podia ir buscá-la, porque não tinha dinheiro para o transporte.
Disse-lhe que outras cinco mulheres, que não eram sul-africanas, tinham conseguido chegar a minha casa à hora marcada. Uma delas até veio com uma criança às costas, na neneca.
Esse episódio, entre muitos outros, mostrou-me claramente que nós, sul-africanos, achamos que temos direito a tudo. Achamos que o mundo nos deve alguma coisa.
Isso é sobretudo verdade para os negros. Não me levem a mal, mas, directamente ou indirectamente, pensamos que o apartheid é uma coisa a que nos podemos agarrar para podermos ser vistos como vítimas, e que tudo nos devia ser facilitado.
E aqui estamos nós, 14 anos após o início da democracia na África do Sul, ainda agarrado a 1976.
Muitos de nós não conseguem aproveitar o acesso à educação nem a oportunidade para aprender mais e marcar a diferença. Por isso abusámos de pessoas que estão simplesmente a fazer os possíveis por ganhar a vida.
Os recentes ataques contra estrangeiros são a prova de que somos uma nação estúpida.
"Roubam-nos os empregos e violam-nos as mulheres", dizem os responsáveis por centenas de crianças inocentes estarem agora a viver em tendas com as famílias.
Como é que alguém pode tomar em mãos o seu destino quando os sul-africanos, no velho estilo dos bairros negros, se sentam todo o dia a apanhar sol, na má língua e a queixarem-se dos estrangeiros que lhes roubam os empregos?
Como é que uma pessoa que se esforça tanto por arranjar emprego e por exercê-lo bem merece ser espancada e até queimada?
Não percebo como fomos engendrados como sul-africanos. Sei que não temos todos a mesma mentalidade, e que há cidadãos instruídos que são completamente opostos a tais actos. Mas a rapidez com que esses ataques se espalharam é uma vergonha nacional.
Porque é que não participamos de forma tão rápida e colectiva em actividades de construção nacional? E porque estamos tão dispostos a participar quando se trata de coisas que não só destroem vidas humanas como também a economia e a credibilidade do país?
Dizemo-nos uma nação civilizada? Tenho vergonha de ser sul-africana.
Somos uma nação bárbara, e o nosso pior pesadelo.
Pergunto-me o que acontecerá quando finalmente atingirmos o objectivo de arruinar por completo o país - a economia, a credibilidade e os valores sociais - e precisarmos da ajuda dessas mesmas pessoas que andamos a matar.
Será que esperamos que esses países cuidem dos nossos filhos como fizeram no tempo do apartheid para regressarem à África do Sul como dirigentes instruídos, sábios e capazes?
Ou será que esses países também têm o direito de espancar os nossos filhos, de os queimar vivos e de os escorraçar como se fossem criminosos?
NOMFUNDO XULU

In The Times, 26/5/2008

quinta-feira, maio 22, 2008

Vergonha...Vergonha...


Há muitos dias que aqui não venho. Por uma única razão: não tenho bons motivos. África, a minha África, aquela que me viu crescer e onde eu aprendi a amar a Natureza e os Homens está a transformar-se num pantanal, num lodaçal pestilento, onde imperam a ganância, a ambição e o desprezo pelos semelhantes.

África, a Terra que me temperou o carácter, me moldou a coragem para vencer as dificuldades que me foram surgindo na vida, me tornou forte dando-me a conhecer as minhas fraquezas é, nos jornais, nas televisões e nas informações privilegiadas que me vão chegando,um mundo de podridão, onde nem já as imagens de extraordinária beleza da sua natureza privilegiada conseguem atenuar.É uma terra de Vergonha


A África que eu aprendi a amar, cujas histórias me encheram os sonhos de criança, fizeram despontar as utopias de adolescente, me alimentaram o entusiasmo da juventude e me pediram o sacrifício das minhas ambições pessoais, povoou-se de mostrengos e assombra-me as noites com pesadelos repletos de abutres que se multiplicam na mesma proporção das serpentes que se plantam no meu caminho - estreito para os meus chinelos de borracha e dedos de fora.

São as notícias de Lisboa - que falam de África - : a filha do Presidente JE dos Santos comprou no Alto da Barras três casas. Uma para ela, outra para família, outra para o corpo de segurança e a cave de uma delas foi transformada em cofre.

São as notícias que vêm de Luanda: a mesma senhora, filha do mesmo senhor dá uma festa de aniversário milionária, que envergonha as muito faladas festas dos capitalistas (colonialistas) portugueses do tempo da outra senhora, dadas em Cascais.

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A festa da senhora tem como enquadramento exterior uma multidão de pobres, miseráveis, a quem o pai da aniversariante e outros prometeram a abastança, a prosperidade, a felicidade, com casas, escolas e saúde para todos.
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Afinal, as casas e as escolas; a saúde, a prosperidade e a abastança não podem ser para todos, porque, meia dúzia tomaram tudo entre mãos - mesmo os que, noutros tempos, quando se falava na justa luta de libertação estavam do lado dos chamados "exploradores" e se colocaram agora no papel de super-exploradores.

E não apenas estes, mesmos os que eram, de facto, os exploradores, os que fomentavam o trabalho escravo, os que dominavam as fazendas do café e do algodão, os que se serviam do estado colonial e viviam à grande em Lisboa, mandando atirar granadas defensivas sobre trabalhadores descontentes, mesmos esses estão, mais uma vez, e agora de forma ainda mais descarada, a usurpar as escolas, a saúde a prosperidade e a felicidade dos não sei quantos milhões de esfomeados, que há trinta anos acreditaram que teriam uma vida melhor. Eles acreditaram e transmitiram essa esperança aos filhos, aos netos. Alguns já morreram, abençoando a hora do fim...
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...Mesmo esses estão, de novo, instalados, com bancos, com operações imobiliárias, explorando(de novo) o café, metidos nos diamantes, nos negócios dos generais. E, de novo, a assobiar para o lado. Que lhes interessa a miséria que campeia? Eles nem sequer a vêem..

De resto, têm a certeza de que a sua reputação jamais será manchada - tal como noutros tempos . O poder actual está a encarregar-se de montar um sistema de comunicação social insuperável; uma televisão e uma rádio nacionais, dois jornais e duas revistas semanais, um jornal diário e a assistência imprescindível dos donos da intriga em Portugal, os que sabem como se compram jornalistas. Assim, tanto o poder como eles têm "boa" imprensa lá e cá.

Mas, olhando o resto de África ficamos admirados por não ser de Angola que chegam as piores notícias. Elas vêm do Zimbabwé, onde a senilidade de Mugabe serve de campo fértil para os ambiciosos e gananciosos da ZANU, que, na perspectiva de perderem o velho e decrépito ditador, se aprestam a assegurar o futuro deles, esquecendo que transformaram uma dos países mais ricos de África num pântano de desgraças, palco de morte por doença e fome.


Os que fogem à fome e à doença do Zimbabwé e procuram a República da África do Sul, a tal que teve a solidariedade do Mundo inteiro para se ver livre de um regime político injusto porque se servia da cor da pele das pessoas como critério para as dividir, esses mesmos, quando chegam junto dos libertados da segregação, são recebidos com tochas, com balas, mortos e queimados ao som de risos alarves.

Mortos porque acusados de roubarem o trabalho aos que, noutros tempos, no tempo da segregação, sempre o tiveram , bem como saúde e educação.

O mesmo acontece aos moçambicanos que foram em busca de melhor situação no país vizinho, fugindo à ambição e à ganância de todos os guebuzas que por lá existem e noutros tempos implantavam campos de reeducação para os reaccionários. "Eram reaccionários, sim!" - dizia ARMANDO. "basta olhar para eles, são brancos".

Foi este mesmo que há uns meses lançou um grito alarve de contentamento: "Cahora Bassa é nossaaaaa...!!!!" Oxalá saiba cuidar dela.

São também as notícias que chegam do Quénia, com as tribos em pé de guerra, querendo exterminar-se uns aos outros e o horror de Darfour a que nada consegue pôr cobro.

Porque será que os americanos não se preocupam com esta gente do Darfour, que está a ser exterminada só porque tem outra cor e outra religião. Lembram-se do pretexto utilizado para invadir o Iraque e enforcar o Sadam Hussein? Porque havia armas de destruição massiva ( que nunca se encontraram) e porque o ditador atacou com gaz um grupo grande de curdos, seus adversários políticos - e hoje adversários dos americanos.

quinta-feira, abril 24, 2008

Zimbabwé, Uma Vergonha para África


O que está a acontecer no Zimbabwé com Robert Mugabe a fazer de ditador palhaço, prenunciando com a sua estratégia de manutenção do poder, mais um banho de sangue em África, é, em primeiro lugar, uma vergonha para os próprios zimbabweanos, já que não são capazes de lutar contra um tirano com a cor da sua própria pele.



Reunião em Harare, nos tempos em que ainda se creditava que era possível uma democracia


Para eles a tirania era a dos brancos.
Mugabe será sempre o "freedom figther" contra Ian Smith, mesmo qeu tenha destruído um dos mais próperos e lindos países da África Austral.





Em segundo lugar é uma enorme vergonha para toda a África, que, mais uma vez, não consegue, através da sua organização continental, a União Africana, resolver um problema que é sobretudo um ataque aos direitos fundamentais do Homem. Mas, essa vergonha é maior ainda para os países vizinhos do Zimbabwé, que se reuniram, para, no final, com o seu silêncio, confortarem as posições de Mugabe.





ESte silêncio tem, obviamente, uma explicação: todos eles se sentem iguais a Mugabe, quer pelo passado longíncuo e recente, mas também pelo presente e, alguns, até, pelo futuro próximo.

segunda-feira, abril 21, 2008

Hugo Azancot de Menezes

Muitos dos textos publicados ultimamente - e não só - neste blog têm comentários de um anónimo a dar conta do percurso de Hugo Azancot de Menezes. Nada tenho contra esta estratégia, embora me pareça pouco eficaz para aquilo que me parecem os seus objectivos: fazer lembrar alguém que teve importância política no movimento de libertação de Angola mas de que ninguém fala, porque não se lembram ou porque - o mais certo - não querem lembrar-se.
A este anónimo (não lhe fica bem não assinar) gostava de sugerir outra forma: por exemplo, envie-me para o meu e-mail um resumo biográfico de Hugo Azancot de Menezes e eu terei muito gosto em o publicar, nem que seja em episódios. Valeu?
Deste modo ficaríam os comentários para os que desejem, de facto, comentar as matérias tratadas nos textos publicados.

quinta-feira, abril 03, 2008

Mugabe - o FIM?




Apesar das dúvidas que ainda se levantam através dos jornais afectos a Mugabe e à sua pandilha, parece certo que Mugabe vai deixar de escravizar o seu povo e de povoar a cabeça do resto do Mundo com os números de uma independência que envergonha quem a defendeu e quem por ela lutou - incluindo o próprio Robert Alibabá -.






Apesar das dúvidas, não podia deixar de vir aqui expressar a minha enorme alegria pelas pespectivas de uma nova libertação de uma parte de África que caiu no inferno indiscritível de uma escravidão perpetrada por um facínora sem nome e sem classificação.






Apesar das dúvidas, aqui estou saudando a vitória da democracia contra a fraude, da vontade de mudança contra o desejo de continuidade de algumas dezenas de aproveitadores da senilidade de um homem que, podendo passar à História do seu país como herói, vai passar como o maior ladrão que por lá passou e, agora, seguramente, não saberá, sequer, para onde ir.

sábado, março 08, 2008

Miguel Lemos


Hoje, logo pela manhã, o telefone trouxe-me a notícia: morreu o Miguel Lemos. A morte é sempe uma violência, mas, se inesperada e de alguém que fez parte da nossa vida, é-o ainda mais. Eu e o Miguel Lemos conhecemo-nos, fomos e éramos amigos, travámos lutas políticas juntos. Tínhamos divergências. Algumas delas exprimia-as aqui neste blogue. Perante o seu passamento fica apenas a saudade , a recordação de um companheiro e a tristeza por uma parte da minha vida ter ficado mais pobre.