Não é verdade que pareça ter sido ontem. Já foi há muito tempo. Outubro de 1975. Um grupo armado do exército sul-africano, orientado por militares portugueses do ELP e - porque não dizê-lo? - por alguns angolanos, entraram no Lubango. A 23 de Outubro. Eu tinha comemorado o meu aniversário dois dias antes e, premonitoriamente, não tinha lavado a louça - um montão de pratos e panelas.
O tal grupo ocupou-me a casa distribuiu a louça , roubou-me os albúns e os documentos e espalhou-me a fotografia por todos os cantos oferecendo 100 contos a quem dissesse onde estava eu.
E onde estava eu?
Primeiro, tentando organizar a defesa da cidade. Ainda no dia 22, nas traseiras do Bairro da Mitcha, subi para cima de uma camioneta e disse a toda a gente o que se estava a passar. Depois agarrei em cada arma que me apresentavam - algumas bem estranhas - e explicava como "aquilo" funcionava.
Eu próprio fiquei admirado com os meus conhecimentos...
No dia 23 foi a confusão total. Eu parti para a Cacula, onde supostamente estariam os reforços cubanos. A minha mulher foi para o aeroporto, onde, supostamente, chegaria um avião com armas. Acabou convidada pelo comando local a traduzir uma conversação em inglês captada pelos receptores do Aeroporto. Rapidamente percebeu que eram conversações em código e que os seus autores estavam bem perto.
O princípio que havíamos estabelecido tinha-se quebrado: "na hora da confusão temos que estar juntos". Qual quê?
Ela voltou do aeroporto, telefonou para tudo quanto era centro de decisão do MPLA, incluindo os militares, e ninguém respondeu. Estava toda a gente a caminho de Luanda, "fazendo relatório da situação" ( não me venham agora pedir textos para memórias heróicas...fugiram todos!!!!)
Há mesmo algumas situações kafkianas. No Lubango, havia uma residência universitária, razoavelmente bem apetrechada, que dava guarida a algumas estudantes universitárias que vinham de longe e não tinham meios para pagar hospedagem noutros locais: hotéis, pensões, casas particulares...
No calor da disputa política entre 1974 e 1975, todas elas aderiram ao MPLA. A residência transformou-se, por isso, num bom local para esconder armas e outro equipamento.
Ora, a quando da invasão militar sul-africana, e a seu propósito, toda a gente se interrogava sobre o que fazer, dois responsáveis pelos serviços de "inteligência" do MPLA passaram pela residência feminina, aconselhando as suas utentes e ficar em casa, enquanto eles, detentores de poderosos carros, iam a caminho de Luanda, também "para informar".
E onde andava eu ?
Consegui montar uma caravana automóvel, onde reuni a família, isto é, os meus dois filhos mais a mãe deles, alguns amigos e algumas das estudantes entregues pelos tais dirigentes. Era uma caravana complicada, porque, na verdade, já se estava a concretizar o saque. Havia uns tantos dos chamados responáveis do MPLA que tinham em seu poder um número impressionante de livretes de automóveis e, que por isso, tentavam controlar as viaturas.
Os responsáveis militares, esses desapareceram.
Alguns deles, encontrei-os na Cacula - o cruzamento estratégico nas estradas Lubango-Benguela, Lubango-Huambo.
Os outros tinham desaparecido literalmente, internaram-se no mato e prepararam-se para viver como no tempo da guerrilha, entre a população. Alguns apareceram depois a contar estórias mirabolantes de resistência que nunca aconteceram. São alguns desses que agora se preparam para relatos literatos de heróicidades inspiradas nos filmes do Rambo.
A um deles eu devo prestar homenagem, porque não fugiu e nunca abandonou a sua gente: Emílio Braz, que, de algum modo tentou organizar o fluxo de gente que saía da cidade e que, depois, em Caluquembe organizou a logística , fazendo daquela Vila um hipotético centro de resistência.
O tal grupo ocupou-me a casa distribuiu a louça , roubou-me os albúns e os documentos e espalhou-me a fotografia por todos os cantos oferecendo 100 contos a quem dissesse onde estava eu.
E onde estava eu?
Primeiro, tentando organizar a defesa da cidade. Ainda no dia 22, nas traseiras do Bairro da Mitcha, subi para cima de uma camioneta e disse a toda a gente o que se estava a passar. Depois agarrei em cada arma que me apresentavam - algumas bem estranhas - e explicava como "aquilo" funcionava.
Eu próprio fiquei admirado com os meus conhecimentos...
No dia 23 foi a confusão total. Eu parti para a Cacula, onde supostamente estariam os reforços cubanos. A minha mulher foi para o aeroporto, onde, supostamente, chegaria um avião com armas. Acabou convidada pelo comando local a traduzir uma conversação em inglês captada pelos receptores do Aeroporto. Rapidamente percebeu que eram conversações em código e que os seus autores estavam bem perto.
O princípio que havíamos estabelecido tinha-se quebrado: "na hora da confusão temos que estar juntos". Qual quê?
Ela voltou do aeroporto, telefonou para tudo quanto era centro de decisão do MPLA, incluindo os militares, e ninguém respondeu. Estava toda a gente a caminho de Luanda, "fazendo relatório da situação" ( não me venham agora pedir textos para memórias heróicas...fugiram todos!!!!)
Há mesmo algumas situações kafkianas. No Lubango, havia uma residência universitária, razoavelmente bem apetrechada, que dava guarida a algumas estudantes universitárias que vinham de longe e não tinham meios para pagar hospedagem noutros locais: hotéis, pensões, casas particulares...
No calor da disputa política entre 1974 e 1975, todas elas aderiram ao MPLA. A residência transformou-se, por isso, num bom local para esconder armas e outro equipamento.
Ora, a quando da invasão militar sul-africana, e a seu propósito, toda a gente se interrogava sobre o que fazer, dois responsáveis pelos serviços de "inteligência" do MPLA passaram pela residência feminina, aconselhando as suas utentes e ficar em casa, enquanto eles, detentores de poderosos carros, iam a caminho de Luanda, também "para informar".
E onde andava eu ?
Consegui montar uma caravana automóvel, onde reuni a família, isto é, os meus dois filhos mais a mãe deles, alguns amigos e algumas das estudantes entregues pelos tais dirigentes. Era uma caravana complicada, porque, na verdade, já se estava a concretizar o saque. Havia uns tantos dos chamados responáveis do MPLA que tinham em seu poder um número impressionante de livretes de automóveis e, que por isso, tentavam controlar as viaturas.
Os responsáveis militares, esses desapareceram.
Alguns deles, encontrei-os na Cacula - o cruzamento estratégico nas estradas Lubango-Benguela, Lubango-Huambo.
Os outros tinham desaparecido literalmente, internaram-se no mato e prepararam-se para viver como no tempo da guerrilha, entre a população. Alguns apareceram depois a contar estórias mirabolantes de resistência que nunca aconteceram. São alguns desses que agora se preparam para relatos literatos de heróicidades inspiradas nos filmes do Rambo.
A um deles eu devo prestar homenagem, porque não fugiu e nunca abandonou a sua gente: Emílio Braz, que, de algum modo tentou organizar o fluxo de gente que saía da cidade e que, depois, em Caluquembe organizou a logística , fazendo daquela Vila um hipotético centro de resistência.
Sem comentários:
Enviar um comentário