sábado, novembro 26, 2005

EM ROTA SEM OTA

Foi entre o fim dos anos 30 e o princípio dos 40 que a Portela arribou. Era para lá de Lisboa, num descampado. O mais próximo que por ali medrou foi o musseque da Encarnação, afastado do Areeiro por uma longa avenida, nada fácil de trepar. A Carris não ia além desse Areeiro, com os «eléctricos», que autocarros ainda não havia e «metro» nem se sonhava. Mas o aeroporto era um luxo e merecia demoradas visitas da populaça pasmada a ver os aviões a subir ou descer, ali tão perto!
O musseque, esse, pretendia ser, na altura, a imagem do governo preocupado com os assuntos sociais: um bairro para famílias remediadas, das classes menos favorecidas, mas com alguns favorecimentos à mistura. As rendas eram baixas e a casa revertia para a família após 20 anos de residência. O contra era o isolamento, a distância da «cidade», onde havia que fazer as compras e onde, no fim de contas, se trabalhava. Alguns davam-se ao luxo de possuir bicicletas, mas era preciso ter canetas para tepar a avenida que era ou iria ser Gago Coutinho. Mas, ao domingo, podia-se ir ver o aeroporto: era quase perto. As sanzalas de Chelas e Olivais eram mais distantes.
Deve ter perdurado uma vintena de anos a expansão desse tipo de bairros, que tinham uma designação que já não me recordo. Lembro-me de um anterior, no Porto, no Ameal, onde fui menino e moço, com os meus pais. O pai era natural do Porto, mas zarpara miudo para Lisboa e até era do Benfica, ao contrário daquele braço de família nortenha, cujo apelido era justamente Benfica!
E em Oeiras também. Aliás Oeiras voltou a ter outro, mas sem a característica uni-familiar, antes com edifícios de 4 pisos e sem «herança» ao cabo de vinte anos. A «generosidade» do Estado Novo havia-se esgotado. O modernaço musseque de Alvalade deve ter dado início a novo conceito de bairro económico. Mas os tempos já eram outros. Primeiro, os autocarros chegavam ao aeroporto e ao musseque próximo, depois os popós tornaram-se acessíveis, sobretudo a quem tivesse renda baixa.
A cidade expandiu-se. Alvalade veio pela av. de Roma até à Alameda e do Areeiro foi descendo para além da Encarnação. O aeroporto foi ficando cercado, mesma assim incomodando os candidatos a senhorios. Contudo ele cresceu também. Sei porque trabalhei lá, nas obras de expansão. Fui ferramenteiro.
Tudo isto para dizer que o poiso da Portela resistiu a muito, acomodou-se. Faz parte da cidade
E se o futuro coiso da Ota vai custar muito, por muito tempo, o meu receio é que venha a ser justamente o antigo a pagar a crise, a alimentar os partidos e alguns partidários,bem como satisfazer a gula dos construtores de obras primas ou primogénitas!
Porque é disto que se trata e o governo aceita que o que faz falta é animar a malta. Os 56 mil empregos é fogo de vista. Deixem a Portela em Paz! Façam a Ota onde quiserem e quando quiserem e tanto faz que seja a 17 como a 18, mas não fechem o que está feito. Deixem-no funcionar de dia, reduzam-no ao tráfego da CEE. Pensem no que fazer ao de Beja e lembrem-se que na rota dos tgv os aeroportos não são rentáveis!
E se querem investir no futuro invistam em escolas portuguesas nos países onde se fala português e em países onde Portugal marcou presença. A divulgação da língua é a base do sucesso de qualquer plano tecnológico, por mais manhoso que ele seja, por mais pretencioso que se apresente. Para se chegar acima é preciso começar por baixo...

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