Fui professor na Guiné Bissau, nos idos de 70. Voltei a Bissau depois do golpe de 14 de Novembro de 1980 como correspondente da ANOP, condição que mentive durante 4o dias, findos os quais fui expulso. Deram-me um prazo de 20 horas para sair.
Foi sobretudo na primeira circunstância que melhor conheci o país, ainda sob a presidência de Luís Cabral. Havia um Estado organizado - tão bem quanto o poderia ser - com alguns sectores a funcionar razoavelmente e podia descobrir-se uma estratégia de desenvolvimento, embora alguns erros cometidos não tenham uma explicação plausível.
O golpe de 14 de Novembro de 1980 foi sobretudo contra os caboverdianos. O homem que apareceu a liderá-lo - Nino Vieira - era o primeiro-ministro do governo de Luís Cabral. Um primeiro-ministro que nasceu da necessidade de estabelecer equilíbrios entre guineenses e caboverdianos e nada mais. Nino era, praticamente, analfabeto e a sua ocupação preferida eram as mulheres. Muitas das suas namoradas de circunstância vinham a Lisboa para comprar vestidos e outras coisas . Quem pagava era Nino, isto é, o governo, isto é a cooperação internacional.
Para perceber esta afirmação é necessário saber que a Guiné Bissau foi o país que recebeu da parte da comunidade internacional a maior ajuda que foi prestada a um país depois da independência.
Com o golpe, Nino, elevado à condição de presidente, começou a sentir-se ameaçado de todos os lados e à sua ocupação preferida juntou outra; eliminar os seus possíveis adversários. O país acentuou as deficiências, o Estado passou a ser um amontoado de amigos, sem competência ou de homens que, pressionados, tinham que aceitar lugares de ministérios mais difíceis.
As coisas foram piorando e Bissau transformou-se numa cidade-estado sem lei, onde o principal objectivo era sobreviver.
Com Nino, a Guiné Bissau trasnformou-se num dos mais pobres países do Mundo, sem que para isso haja razões naturais. O descontentamento cresceu e estendeu-se ao sector onde o grande guerrilheio da guerra anti-colonial tinha grande influência: ao exército.
A instabilidade política provocou crises sobre crises e o "fundo" estava cada vez mais "fundo".
O homem do barrete vermelho foi outro episódio da história da Guiné Bissau que ninguém consegue explicar.
Até que Nino regressou ao poder, quase que por um passe de mágica.
E o que é que acontece?
Neste momento discute-se, publicamente, a hipótese de uma associação da Guiné Bissau com o Senegal e sabem-se pormenores da miséria guineense que atinngem as raias do incrível, com pedidos dramáticos para o fornecimento de gasolina...
Já escrevi há mais de vinte anos que não descubro qualquer hipótese de a Guiné Bissau poder continuar a afirmar-se como país independente, com um estado autónomo, regido por guineenses.
Hoje reafirmo essa convicção, na certeza de que o eventual anúncio desta associação com o Senegal, despertará na Guiné Conackri o velho sonho da "Grande Guiné". No final, o mal menor será uma divisão entre os vizinhos do Norte e do Sul.
Deste modo também será resolvido de vez o velho imbróglio das fronteiras marítimas da Guiné Bissau, que mercê de um acordo entre Salazar e De Gaulle, estão em desacordo com as leis internacionais, o que tem impedido a exploração do petróleo que existe no mar da Guiné Bissau.
Provavelmente, este será o primeiro golpe na Carta da ex-OUA que impede a todos os estados independentes de África alterar as fronteiras herdadas da colonização. Nessa perspectiva, daqui a alguns anos, os professores de História dirão aos seus alunos: "aqui, nesta zona, houve, em tempos, a tentativa de um estado independente"...foi um puf histórico.
2 comentários:
Perguntou-se , RAMALHO EANES, no jornal Expresso, porque a Guiné Bissau, haveria de ter os Caboverdianos à cabeça da luta de libertação; Será que o povo Guineense, principalmente aqueles que lutaram contra "esta independência" não terão a mesma pergunta na cabeça?
Já cá vim!
Andas a escrever pouco...
Um abração
Jorge (Moniz Ribeiro)
Enviar um comentário