segunda-feira, setembro 18, 2006

PELOS TEMPOS IDOS E VINDOS

O sonho de quantos sonham viajar pelo futuro é, bem entendido, moldar a presente. Ir ao futuro, mesmo à sucapa, seria a maneira mais segura de albardar burro. Conhecer por antecipação a senha do euro-milhões era porreiro, mas estou em crer que o retorno à realidade tem por obrigação divina andar suficientemente atrazado para afastar o turvo olhar do lucro fácil.
Já a maneira como se molda o passado, como se procura explicá-lo, também não é inocente. A «lavagem» de factos e personagens tem em vista adocicar as questões da actualidade, caiar a fachada para tapar a ruina.
Ontem dei uma espreitadela ao prof, ainda o Porto não tinha aberto o activo. No meio do paleio dele sobre o procurador que aí vem, veio o Porto e meteu um golo, que eu não vi. É por estas e por outros que eu não gosto de muito sujeitos palradores. Era óbvio que ele não sabia quem vai ser a criatura escolhida, como é demasiado óbvio que ele gostava de saber antes dos outros saberem... Mas foi quando ele publicitou o livro de Almeida Santos que prestei atenção. De maneira simpática, o comentador foi prevenindo que se trata da versão do dirigente socialista. O prof acreditava que Almeida Santos tinha sido amigo do pai, o (então) advogado preferiu reduzir a mera cortesia.
Almeida Santos, a quem ouvi, uma vez, dizer que não tinha feito voto de pobreza, a propósito da maneira como se despediu de Lourenço Marques, descreve o que viveu e ao que assistiu. Espero ler, se o book não for caro ou algém simpático mo emprestar, a sua quase memória, que se deve, muito provavelmente, traduzir por memória corrigida e aumentada...
O prof comentarista surpreendeu-se pela citação de que Spínola teria revelado que Marcelo não se importava que a guerra na Guiné tivesse sido perdida. Foi verdade. Spínola zangou-se bem com isso. Não por mór da Guiné, bem entendido, mas por ele, Spínola guerreiro. Perante o cenário que o general expunha, Marcelo terá dito: «E então? Se perder perdeu...» O general de Salazar perdeu Goa e ele não deixou as colónias por causa disso.
Se Spínola não perdeu definitivamente a guerra, acabou por perder, com estrondo, a sua posição no 25 de Abril. Pôs-se a milhas. A guerra portuguesa em África não foi perdida pelos militares, mesmo se eles nunca pareceram capazes de a ganhar. Foi perdida pelo Estado Novo, por Salazar, que cedo percebeu o que estava a acontecer no mundo do pós guerra. Acreditou
que podia dar a volta por cima, substituindo colónias por províncias ultramarinas. Se tivesse, logo que perdeu Goa, mudado a capital da «pátria una e indivisível» para Luanda talvez tivesse criado um dilema político complicado às estâncias internacionais.
É giro! Vinha do Brasil, aonde acompanhei o já citado Marcelo (padrinho) , quando o homem pisou a Lua. O homem pode ir longe no espaço, mas não consegue andar no tempo. Nem para a frente nem para trás. O papa caiu em si, a infalibilidade esmoreceu.
De manhã já era segunda-feira. Estava a lavar os dentes que me restam quando dei por mim a rir: os metereologistas, esses, passeiam no tempo, prevêem o futuro, sabem hoje o que vai ser amanhã. Que pena Sócrates não ser metereologista...

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