Manuel Acácio, um nome conhecido no jornalismo radiofónico de qualidade - que já vai rareando -acaba de publicar um livro com um título atrevido, "Balada do Ultramar". Este romance é uma narrativa corajosa, não da sua própria experiência, mas do entendimento que conseguiu perceber do sofrimento atroz que foi para centenas de milhares de portugueses (brancos e também muitos negros) o abandono das terras onde muitos deles já tinham nascido. Alguns foram atirados fora da terra dos seus avós.
Manuel Acácio revela ao longo das 221 páginas do seu "romance" um trabalho sério, honesto e difícil de investigação - que lhe permitiu descrever cenas reais, sobretudo de Angola e de Portugal. O resultado é uma conclusão que eu vejo pela primeira vez escrita, anda por cima em bom português: os portugueses foram expulsos por razões fundamentalmente racistas e recebidos naquela que teoricamente seria a sua terra por gente que os via como invasores do seu espaço pequenino, miserável, sem qualidade e sem perspectivas.
Neste livro de Acácio está escrito que também os políticos da época e os que se seguiram, voltaram as costas aos despojados de passado, de presente e sem futuro. Aqui está explicada a razão porque há muita gente a negar que a descolonização portuguesa tenha sido uma operação "exemplar e bem conseguida".
A integração mais ou menos pacífica que os chamados "retornados" conseguiram em terras portuguesas foi obra sua, da sua qualidade humana e também das perspectivas abertas de sociedades mais abertas, mais livres e mais solidárias. Portugal beneficiou imenso com esta injecção especial de gente de qualidade excepcional.
Ao contrário, os países entretanto nascidos desta "descolonização exemplar" sentiram claramente a sua falta. Tanto assim que, dos cinco, apenas o mais pobre (Cabo Verde) beneficiou, objectivamete, o seu povo com o acesso à Independência.
A "Balada do Ultramar", uma edição da "Oficina do Livro" retrata as gentes que fizeram parte do primeiro êxodo. Há, todavia, outros, mais silenciosos, mas igualmente importantes para Portugal e ainda mais devastadores para os países para quem os brancos passaram a ser inimigos.
Ao felicitar o Manuel Acácio pelo seu excelente texto, não posso deixar de apontar alguns livros que uma vez por outra aparecem por aí a explorar de forma miserável a saudade dos que ainda se lembram do que deixaram para trás, muitos deles baseados em fotografias dos pais, dos avós e dos amigos, explorando oportunisticamente redes de contactos como prateleiras de hipermercados.
1 comentário:
Com todo o respeito q se deve ter pela criação literária, urge um "murro na mesa".
Desculpa, sr. dono do Blog, mas quem lê o primeiro parágrafo deste post depara-se com uma atitude (injusta) de hierarquisar o direito à terra, falando de Angola. E, pondo de parte a hipocrisia de incluir "negros" entre os q foram arrancados da sua (suposta) terra, diria q pessoas q pensam como o senhor pecam pelos seguintes motivos:
1. Não é o branco o angolano de verdade e mais legítimo - poderá até o sr. recorrer ao escudo de "racismo", mas o branco não veio aqui como amigo. E esse negro, que implicitamente o sr. tenta culpabilizar, também não cedeu as terras, foram roubadas. De resto, lembrar isso é até pleonasmo.
2. Por outro lado, e numa altura em q todos os olhos de Portugal querem dar para Angola, não digo tanto o livro mas a abordagem, é apenas um meio para justificar o regresso, do tipo chantagem emocional.
3. Estes mesmos angolanos, brancos portugueses, a quem se deve agradecer a guarida que deram aos angolanos que foram à Tuga, pecam por um motivo. São angolanos do tempo de paz, cujo saudosismo é excitado pela crise económica e as perspectivas de crescimento de um país, onde, uma vez instalados, se julgam possuir estatuto paternalista de ex-colonizador.
4. para o sr deve ser difícil imaginar, mas há angolanos que não têm nem precisam de vestir nacionalidades mediante os tempos. De resto, como dizia alguem, ser angolano não se define-se, é-se, sente-se!
Abílio Likata
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